Home Edição de 22/09/2022

A Fibra Óptica – Capítulo II

A Fibra Óptica no Brasil

Na década de 1960, a transmissão de dados por sinais luminosos em fibras ópticas se tornou uma forte candidata a substituir, gradativamente, os sistemas baseados em fios de cobre nos sistemas de telefonia. Duas limitações, no entanto, impediam o desenvolvimento da tecnologia: as grandes perdas de luz durante a transmissão e o excessivo calor que os lasers geravam. Enquanto o professor Zeferino Vaz fundava, em 1966, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), pesquisadores de diversos países reunidos em empresas e universidades norte-americanas estavam em busca de soluções para o uso da tecnologia, que só foram vencidas em 1970.
Foi quando a empresa norte-americana Corning fabricou a primeira fibra óptica com baixa perda de luz e, nos Laboratórios Bell, da AT&T, foi desenvolvido um tipo de laser capaz de operar à temperatura ambiente. Três pesquisadores brasileiros que estavam nos Estados Unidos e acompanharam de perto as descobertas – Rogério Cerqueira Leite, Sérgio Porto e José Ripper Filho – aceitaram o convite de Vaz e retornaram ao Brasil para liderar, na Unicamp, pesquisas na área.
Em 1972, o governo brasileiro criou a Telebrás e investiu nos grupos acadêmicos existentes para o desenvolvimento da tecnologia de fabricação das fibras. O principal resultado desses investimentos foi obtido em abril de 1977, quando a primeira fibra óptica brasileira foi puxada em uma torre de dois metros de altura do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) da Unicamp. “A fibra óptica não foi inventada no Brasil, mas revolucionou os serviços de comunicação no país por ter sido capaz de modificar o mercado ao substituir as tecnologias até então existentes”, disse José Ripper Filho, que em 1971 era chefe do Departamento de Física Aplicada do IFGW, à Agência FAPESP.
Ripper Filho foi um dos protagonistas da criação da primeira fibra óptica brasileira que esteve presente no evento “30 anos da fibra óptica brasileira”, na tarde desta terça feira (22/5/2007), em Campinas. “Percebemos na hora certa a possibilidade de uma mudança radical nos conceitos das comunicações ópticas no país. Ficamos na fronteira do conhecimento em fibras ópticas até o fim da década de 1980”, disse Ripper Filho.
A transferência da tecnologia para a indústria nacional ocorreu por meio do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), o então centro de pesquisa e desenvolvimento da Telebrás, no qual foi montada a planta piloto de fabricação das fibras. Estabelecida em Campinas, a empresa nacional ABC X-Tal contratou pessoal do Grupo de Fibras Ópticas da Unicamp e assinou contrato de US$ 6 milhões com a Telebrás para produzir 2 mil quilômetros de fibra óptica. O primeiro lote de 500 quilômetros foi entregue em agosto de 1984.
“Na década de 1990, no entanto, eventos como o processo de abertura comercial, mudanças na política industrial e a globalização limitaram o projeto nacional de comunicações ópticas e a maior parte das empresas nacionais perdeu força de mercado”, lembrou Ripper Filho, atual presidente da ASGA, empresa nacional de equipamentos de comunicações ópticas. Atualmente, o CPqD continua transferindo tecnologia à indústria, não mais para a produção da fibra, mas para a fabricação de equipamentos de comunicações ópticas por empresas nacionais como ASGA, Padtec
e Digitel.
“O problema é que as principais concorrentes dessas empresas são oriundas da China, dos Estados Unidos e da Europa, que faturam, em média, 20 vezes mais”, disse o presidente do CPqD, Hélio Machado Graciosa, também presente no evento em Campinas. Para ele, como o Brasil ainda domina a tecnologia de fabricação e transmissão de dados por fibras ópticas, o maior desafio na área para os próximos anos é fomentar a criação de uma grande indústria brasileira “que tenha poder comercial e logístico no mercado internacional”.
“A definição de sucesso em comunicações ópticas é ter as tecnologias nacionais aplicadas no mercado. E isso hoje deve ser perseguido pela indústria, pois a capacitação tecnológica está instalada em várias universidades, indústrias e operadores de comunicação. A Unicamp não tem mais o monopólio tecnológico. A semente plantada há 30 anos frutificou”, conclui Graciosa.
O Brasil foi um dos primeiros países do mundo a dominar a tecnologia de fibras ópticas, ainda no final dos anos 70. Essa vitória se deveu, em grande parte, ao trabalho do professor José Ellis Ripper Filho, na Unicamp. Acreditando nas perspectivas da fotônica, ou seja, das comunicações via fibras ópticas, Ripper fundou em 1989 a ASGa, empresa constituída para produzir lasers semicondutores de arseneto de gálio e outros produtos de microeletrônica. O processo de abertura acelerada do mercado brasileiro no governo Collor tornou inviável a produção nacional de lasers, mas a empresa partiu para novos segmentos e sobreviveu.
O aumento contínuo da velocidade dos sistemas de transmissão de informações e telecomunicações deve-se ao uso da luz em sistemas de comunicações. Só com o uso de comunicações ópticas (baseadas em luz) é possível atingir hoje velocidades de transmissão de centenas de Gigabits por segundo. Isto se tornou possível a partir da descoberta de fibras ópticas com baixas perdas de luz, ocorrida nos anos 70. O Brasil entrou cedo nesta atividade, com a instalação do Projeto de Pesquisa em Sistemas de Comunicação por Laser no Instituto de Física da Unicamp em 1973,
financiado pela Telebrás. Este projeto foi liderado pelo prof. José Ellis Ripper Filho.
Em 1977 foram fabricadas as primeiras fibras ópticas nos laboratórios do Instituto de Física Gleb Wataghin. Em 1978 a tecnologia começou a ser transferida para o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Telebrás, o CPqD, em Campinas. Este processo ilustra uma característica fundamental da transferência de tecnologia entre organizações – o sucesso do projeto se deveu à transferência de cientistas da Unicamp para o CPqD. Em 1983 a tecnologia foi transferida do CPqD para a empresa ABC Xtal, localizada também em Campinas (vizinha do CPqD). Novamente a transferência de cérebros foi fundamental, com a migração de cientistas do CPqD (muitos vindos da Unicamp) e da Unicamp para a ABCXtal. Campinas não virou polo tecnológico por acaso. Se as grandes empresas de telecomunicações e informática se instalaram na região nos últimos anos, com a abertura do mercado, foi porque já existiam recursos humanos de alta qualidade formados por universidades como a Unicamp. O Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW), da Unicamp, pesquisa na área de comunicações ópticas desde 1971. O primeiro contrato de pesquisa & desenvolvimento (P&D) feito no Brasil foi feito entre a Unicamp e a Telebrás em 1974. Em 1976, a primeira fibra óptica nacional levou à criação do Centro de Pesquisa & Desenvolvimento (CPqD), com pesquisadores do instituto, na cidade. Em 1978, eles também fariam o primeiro laser de diodo da América Latina. O que aquele grupo de cientistas – muitos deles vindos dos EUA, onde trabalhavam em centros de pesquisa como o Bell Labs – não imaginava é que,
ao longo dos 20 anos seguintes, muitos se tornariam empresários. Diversas pequenas empresas nasceram das atividades do IFGW ao longo desse período, como ASGa, Fotônica, Xtal, Unilaser, Optolink, Ecco, AGC NetTest e Laser Lab. Em 2000, essas empresas faturaram mais de R$ 250 milhões em conjunto.

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